Os avanços em diversidade, equidade e inclusão nas empresas e na sociedade só serão significativos quando as pessoas forem percebidas como indivíduos que carregam diferentes identidades sociais. Este foi o mote que orientou o primeiro workshop de 2023 da Rede ANBIMA de Diversidade e Inclusão, no dia 13 de setembro, com participação de mais de 80 pessoas. A iniciativa faz parte da agenda estruturante do ANBIMA em Ação, conjunto de atividades que elegemos como prioritárias para o biênio 2023/2024.
A experiência de mundo de cada ser humano é moldada por uma interseccionalidade específica, que só ele vive, e que perpassa por aspectos como raça, idade, classe social, escolaridade, ocupação, território, orientação sexual, condições físicas e mentais. Entender essa interação dos marcadores permite ter mais clareza para analisar a complexidade das barreiras que cada pessoa enfrenta.
Dentro do conjunto de identidades sociais, uma delas está presente desde o nascimento para todas as pessoas. “Você nasce com sua identidade racial e a interseccionalidade vai mudando conforme as experiências e oportunidades que vivencia ao longo da vida. Quando as identidades se entrelaçam, as desigualdades tendem a aumentar. A raça é transversal e pode determinar o grau de vulnerabilidade de cada indivíduo. Se a pessoa é branca e mulher, ela enfrenta desafios de gênero. Mas se a pessoa é negra e mulher, os desafios são ampliados”, ressaltou Benilda Brito, consultora da ONU Mulheres e do Pacto Global e CEO da Múcua Consultoria e Assessoria Interdisciplinar, que conduziu a primeira parte do workshop.
Como avançar na interseccionalidade?
Para ela, alguns aspectos podem ser trabalhados a fim de que as corporações sejam mais acolhedoras e permitam que colaboradores afirmem suas identidades, sem receio. “Quando me autodefino, mostro de qual lugar eu falo. A afirmação de nossa identidade é uma afirmação política, por isso a importância de conhecer a história para entender quem somos, os valores e as identidades que carregamos de nossos ancestrais”, reforçou.
Benilda acredita que práticas que estimulem a autodeclaração de raça e gênero, por exemplo, trazem benefícios às equipes e aos negócios. As pessoas, apropriadas de suas identidades, rendem melhor no ambiente de trabalho, são mais produtivas e realizadas, diminuindo o turnover, por exemplo.
Além disso, censos internos para definir o perfil de diversidade da empresa serão mais bem-sucedidos se antes de aplicá-los lideranças e colaboradores passarem por processos de sensibilização e letramento para desconstruir a cultura de negação de identidades. “A corporação precisa ser compreendida como um lugar seguro para as pessoas se sentirem prontas a responder o censo com transparência”, disse a CEO.
A urgência de um olhar mais amplo
Para resolver desafios que impedem inclusão e diversidade nas empresas é preciso enxergá-los pela lupa da interseccionalidade. Os resultados são diferentes quando pesquisas, ações e projetos implementados nas corporações se limitam a trabalhar uma identidade social isoladamente.
“Um exemplo são as jornadas das mulheres no mundo corporativo, frequentemente moldadas por outros aspectos de sua identidade. Essas mulheres também vivenciam as chamadas microagressões, violências sutis e rotineiras, especialmente em ambientes masculinos. Elas são mais exigidas e cobradas, tendo de provar todos os dias sua competência; excluídas de discussões e tomada de decisão; colocadas para exercer tarefas que não lhes cabem, como servir café e fazer a ata da reunião”, ressaltou a consultora Margareth Goldenberg.
As profissionais com deficiência enfrentam mais discriminação no mercado de trabalho do que outras mulheres sem deficiência, por exemplo.
Estas são algumas situações que só reforçam a importância de se pensar em soluções tendo a interseccionalidade como ponto de partida. “A interseccionalidade das identidades precisa ser vista como uma oportunidade de contratar e atrair a diferença de modo que as diversas camadas dessa integração possam ser encontradas ao redor das mesas executivas para complementar outras culturas prevalentes na maioria das equipes”, ressaltou Margareth.
Como incluir homens bancos, héteros e cis?
A consultora alertou para a prática comumente adotada pelas empresas e ativistas da causa de separar o grupo de sub-representados (como das mulheres) do grupo socialmente majoritário, formado por homens brancos, heteros e cis, focando conversas e ações para os minorizados.
Essa dinâmica os afastou da causa da inclusão e diversidade, o que é um desafio a ser revertido, afinal, são essas pessoas que estão na maioria dos cargos de alta liderança das corporações.
“A segmentação gerou desafios. Homens sentem medo dessa situação porque, isolados do tema, não sabem como falar sobre as questões que causam a exclusão e as injustiças. Também existe um olhar desses homens de que essa agenda não é deles, ou seja, falta empatia. Outro fator que impede esse engajamento é a insegurança. Muitos acham que priorizar a contratação de mulheres negras ou homens negros, por exemplo, vai retirar deles espaços e oportunidades”, contou Margareth.
Para mudar essa situação, são necessárias ações como apresentar a essas lideranças os resultados da jornada de inclusão das empresas com dados que incluam os homens de grupos majoritários para que se enxerguem nesse cenário e percebam que não são só as pessoas de grupos sub-representados que estão avançando. “É importante criar ações intencionais para incluí-los, como grupos de afinidade de homens e facilitadores homens para debater temas sensíveis”, exemplificou a consultora.
Guia de Transparência em Diversidade
Uma das ferramentas que podem apoiar as empresas na construção de uma visão interseccional, olhando para práticas e resultados de forma integrada, é o Guia para Transparência em Diversidade nas Empresas Brasileiras, elaborado pelo LAB (Laboratório de Inovação Financeira) em parceria com a ANBIMA e a Goldenberg Diversidade & Inclusão. O documento reúne orientações práticas para a coleta e o tratamento de informações sobre diversidade dentro das companhias.
Sobre a Rede
A Rede ANBIMA de Diversidade e Inclusão busca fomentar esses temas nos mercados financeiro e de capitais. A partir deste ano, qualquer pessoa de instituições do setor pode fazer parte da plataforma – em 2022, ela era restrita a associados. O objetivo da mudança é estimular ainda mais a transformação do nosso mercado, com o aumento da representatividade e do incentivo à adoção da cultura inclusiva.
Para participar da plataforma, ter acesso às discussões e à área exclusiva do site, basta se cadastrar neste formulário. O foco das atividades são profissionais que atuam em instituições financeiras nas áreas de gestão de pessoas, sustentabilidade, diversidade e inclusão ou que tenham poder gestor para promover a transformação dentro das casas.
Conheça o ANBIMA em Ação
ANBIMA em Ação é o conjunto das principais iniciativas da Associação para este e o próximo ano. Esse planejamento estratégico foi elaborado a partir de uma ampla consulta aos nossos associados, instituições parceiras, reguladores e lideranças da ANBIMA e resultou em três grandes agendas de trabalho: Agenda de Desenvolvimento de Mercado, Agenda de Serviços e Agenda Estruturante. Confira cada uma aqui.